19/08/2008

Lana Bittencourt 1955 "Lana Bittencourt" [Columbia LPCB 35017]

Este é o primeiro disco em formato long-playing, ainda em 10 polegadas, lançado por Lana Bittencourt, em 1955 via Columbia, com fonogramas lançados anteriormente em discos de 78 rotações de grande sucesso. A aceitação do formato LP era ainda modesta e algumas gravadoras preferiam reunir faixas já consagradas em um único produto melhor acabado, do que lançar novas gravações. Muitos artistas tiveram coletâneas de sucessos extraídos dos discos em 78 rpms, como seus primeiros LPs. O resultado era que o novo formato ia criando belas coleções, discos que atravessaram o tempo, preservando a estranha beleza que a música brasileira possuía na época.

Em 1955 a gravadora Columbia possuía um dos melhores estúdios de gravação do país, já familiarizado com o sistema em alta-fidelidade, em uso nos Estados Unidos desde o início da década. A qualidade do registro pode ser percebida em pequenos detalhes como o brilho na voz e nos demais instrumentos, a percussão em destaque e os arranjos orquestrais em profusão impressionante. O que os engenheiros de som conseguiam com os recursos e o sistema da época é de causar espanto.

Lana Bittencourt [nome artístico de Irlan Figueiredo Passos] foi cantora de grandes sucessos, conhecida pela voz perfeita em timbre forte, derramada em sambas e canções internacionais. Estrela das rádios Tupi e da Mayrink Veiga, no Rio de Janeiro, chegou a ter um programa exclusivo na TV Paulista, em São Paulo. Em discos estreou em 1954 pela gravadora Todamérica, passando para a Columbia no ano seguinte, onde permaneceu por muitos anos. Atua até hoje em discos e shows.

Temos aqui os primeiros grandes sucessos de Lana Bittencourt, em uma coleção elegante, a começar pela belíssima capa. Dos primeiros acordes da orquestra em “Malagueña”, fantasia espanhola de Ernesto Leucona, versão em português de Julio Nagib, até o último suspiro do samba-choro “Porque É” de Milton Legey e Paulo Menezes, temos o privilégio de acompanhar a essa bela voz brasileira passeando por oito paisagens musicais. Destaque para a versão em português, também de Julio Nagib, para “Johnny Guitar”, grande sucesso internacional de Victor Young, trilha-sonora do filme homônimo, com arranjos incríveis do maestro Renato de Oliveira, com direito a solo de clarinete. Mas há também o belo samba-canção de Ricardo Galeno “Quem Se Humilha”; outra fantasia de Ernesto Leucona em versão de Julio Nagib, “Andalúcia” em belíssimo arranjo, destaque para a cascata de melodia promovida pela orquestra; e o samba-sincopado [seria uma pré-bossa nova em 1955?] “Pobre Menino Rico”, de Vargas Jr. e Oscar Bellandi, com letra mais que atual: “Pobre menino rico, da zona sul da cidade / embora tenhas de tudo, não tens a felicidade / não jogas bola de gude não sabes rodar pião / não podes pisar descalço a terra seca do chão...” Coisa finíssima!

Lana Bittencourt 1955 “Lana Bittencourt” [Columbia LPCB 35017]

01 Malagueña [Ernesto Lecuona, versão Julio Nagib] fantasia espanhola
02 Johnny Guitar [V. Young, versão Julio Nagib] bolero
03 Quem Se Humilha [Ricardo Galeno] samba-canção
04 Andalúcia [Ernesto Lecuona, versão Julio Nagib] rumba
05 Vai [Go] [R. Evans, A. Aristone, versão Nazareno de Brito] fox
06 Pobre Menino Rico [Vargas Jr., Oscar Bellandi] samba
07 Juca [Haroldo Barbosa] fox
08 Porque É [Milton Legey, Paulo Menezes] samba-choro

Para mais Lana Bittencourt, visite o Bossa-Filmes onde há imagens raras da cantora em 1960, aqui.

10/08/2008

Roberto Inglez 1954 "Um Programa com Roberto Inglez" [Odeon LDS 20.007]

Simplesmente fantástico, este LP foi lançado no Brasil em 1954 pela Odeon no formato de 10 polegadas. À primeira vista pode parecer mais um disco no estilo dos de orquestras de danças, que fizeram muito sucesso e hoje ressurgem nos sites que disponibilizam LPs antigos, mas pelo contrário, “Um Programa com Roberto Inglez” é uma preciosidade musical e de colorido inédito.

Roberto Inglez - na verdade Robert Inglis - nasceu na Escócia em 1913 e aprendeu piano aos 5 anos de idade, aos 15 já possuía o seu próprio conjunto. De origem simples, estudou e chegou a trabalhar como dentista durante o dia e como maestro à noite. Mas o talento musical falou mais alto. Em 1937, estudando regência na Royal Academy of Music em Londres, conhece o maestro Edmundo Ros, membro na época da Don Marino Barreto’s Cuban Orchestra, especializada em música latina. Quando Edmundo Ros deixou Don Marino para formar sua própria orquestra, recrutou Robert, sugerindo o nome artístico Roberto Inglez - já que ele seria o único britânico na formação. Sua estadia ali durou pouco e logo partiu para formar sua orquestra. Com a Segunda Guerra Mundial, a produção artística na Europa é praticamente interrompida e as primeiras gravações profissionais só surgem no final de 1945. No ano seguinte, Roberto Inglez é contratado pelo Hotel Savoy, casa do famoso pianista Carrol Gibbons, e um dos mais sofisticados hotéis de Londres.

Seus discos foram lançados pela Parlophon britânica, pela Coral americana e pelas associadas Odeon na Espanha e no Brasil, e venderam grandes quantidades de 78 rpms e long-playings. Todas as suas gravações trazem a paixão pelos rítmos latinos, especialmente os brasileiros. Em 1952, veio ao Brasil pela primeira vez e liderou uma orquestra de músicos brasileiros com 30 integrantes, em apresentações no Rio de Janeiro [quatro semanas no Hotel Casablanca] e em São Paulo [duas semanas no Hotel Lord]. Diz a lenda que nesta ocasião acompanhou as primeiras apresentações da iniciante Ângela Maria. De volta à Londres, Dalva de Oliveira foi estrela de seu set por duas semanas no Hotel Savoy, encontro que fez nascer 17 registros antológicos lançados no Brasil em LPs da Odeon. Em 1954, casou-se e foi morar no Chile, formando lá a Roberto Inglez y su Orchestra Romanza. Voltou ao Brasil em outras temporadas e para mais gravações na Odeon, se retirando dos meios musicais no início dos anos 60. Faleceu em 1978 na capital Chilena, Santiago.

Este é provavelmente o seu quinto LP no formato 10 polegadas, os outros neste formato, foram lançados nos Estados Unidos pelo selo Coral a partir de 1951. Aqui, o repertório de primeira, é executado com brilho e vigor, em gravação excelente para os padrões técnicos da época. O piano econômico, pinçando notas no silêncio, contribui para a beleza geral e faz pensar: teria Roberto Inglez ajudado a criar o estilo largamente difundido no Brasil com Waldir Calmon, Britinho, José Luciano, indo até João Donato e claro, chegando a Antônio Carlos Jobim?
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O LP abre com uma versão arrasadora do baião “Delicado” de Waldir Azevedo, com direito a chuva de sopros e cordas, numa aula de arranjo. “Mano Generosa” [Texldor] coloca cha-cha-cha na mistura e um solo de trompete com surdina - coisa incrível. O samba-canção “Distância” de Marino Pinto e Mário Rossi, acalma o ambiente e por segundos pensamos que o disco voltará ao padrão musical que estamos acostumados - até a melodia ser levada ao espaço por detalhes fantásticos, beleza indescritível. O tempo fecha de novo, e bongôs anunciam “Marroco” [Fields, Shaw], melodia árabe em roupagem latina, encontro inusitado com metais e sopros em primeiro plano. Em “Calla, Calla” [Samuels] aparecem cavaquinhos e a melodia, dessa vez judaica, vira um sambão de orquestra, com palmas e solos de metais. É de espantar como ficou bonito. “Raminay” [Lawrence, Fain] traz o piano pontuando belos desenhos da melodia, que é desconstruída pela orquestra num crescendo até a explosão final. Em seguida, o baião “Kalú” de Humberto Teixeira, também ganha belo arranjo. O rítmo acelera com “Sururu” [do maestro Lôro], piano em primeiro plano em meio às cascatas melódicas promovidas pela orquestra, percussão pesada e novamente cavaquinho. “Heart and Soul” [Carmicael] beguine muito famoso na época, é suave, melodia deslizando pelo espaço sendo moldada com delicadeza, sem repetir uma única frase. O set encerra com “Brasileirinho” de Waldir Azevedo, acelerada e com estranho colorido. O silêncio final é ainda mais vazio, o que parecia ser uma salada sonora deixa saudade... só resta ouvir tudo novamente... e pensar: Bravo Maestro!
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01 Delicado [Waldir Azevedo] baião
02 Mano Generosa [Texldor] canção
03 Distância [Marino Pinto, Mário Rossi] bolero
04 Marocco [Fields, Shaw] rumba
05 Calla, Calla [Samuels] samba
06 Raminay [Lawrence, Fain] canção
07 Kalú [Humberto Teixeira] baião
08 Sururú [Lôro] samba
09 Heart and Soul [Carmichael] beguine
10 Brasileirinho [Waldir Azevedo] chôro

09/08/2008

Chiadofone!

Espantamos a poeira para anunciar mais um blog de conteúdo na rede, é o Chiadofone, produzido em São Paulo por um time de apaixonados pela música brasileira de outros tempos. “O selo discográfico português Chiadofone, encontrado por acaso num site russo nos idos de 2005, circulou no início do século XX e é o mote deste blog sobre música popular brasileira registrada nos chiados dos discos de 76 e 78 rpm.” é o texto que os apresenta. No interior muita informação e boa música, bons textos, e raridades como as primeiras gravações de Silvinha Telles, gravações raras de Denise Duran, irmã de Dolores Duran... Um blog de primeira, vida longa!